quarta-feira, 11 de julho de 2012

Nove e catorze

A imagem que se esvai com os ventos, se esconde com as nuvens que se evanesceram e sumiram do céu, tão azul céu das nove horas. Há campos verdes onde corpos se estendem, de olhos fechados e mãos nas barrigas, suas roupas são umedecidas por lágrimas e seus rostos alvos já secaram faz tempo. A terra é tão quente quanto o pranto cristalino daqueles que se poem de pé para observar com muita dor o enterro do falecido. Já não estive ali em meus sonhos? Uma vez, talvez, contemplei os mortos outro dia, só possuem números por cima de seus pés e mais nada, alguns outros poucos ganham flores que morrem logo depois e mãos passam trêmulas sobre a terra que os cobrem. O importante é que eu estava lá naquele fúnebre momento, cega com a visão tão bela que é a morte, eu não vi que ali se deitavam mais 146 corpos, e o 147º se despedia mudamente. Só não haviam silenciado as dores de tantos outros que diziam seu último adeus, que tocavam em sua pele amarela e gélida ou observavam á distância enquanto a tristeza os corroía. Eu chorei alto, sem medo de o acordar, eu olhei para o sol que banhava com seu ouro todos os campos, as cruzes e placas faziam sombra, não havia árvores, mas havia o barulho das folhas farfalhando em algum lugar, talvez bem longe dali. Peguei dois braços e com eles fui embora, pela estrada de terra, pela grama rasteira que cobria todos os mortos. É impossível apagar o que te assombra em todas essas madrugadas mal dormidas, o que te lembra nas músicas que ainda tocam no seu aparelho de música. É tarde agora pra esquecer de lembrar.


Gabriela Godinho

Um comentário:

  1. Muito bom Gabriela. Bem intenso e com palavras muito bem encaixadas.

    Marco Aurélio

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